
Depressão e dor crônica? Neurofeedback pode ajudar.
O manejo da dor baseia-se principalmente na farmacoterapia, que possui muitas limitações. Dados da literatura confirmam a alta eficácia do neurofeedback no tratamento de síndromes dolorosas, crônicas e agudas. Este post comenta um achado recente (e promissor) sobre sua aplicação ao alívio da depressão.
Com o passar dos anos, a depressão vai acumulando dados tóxicos na mente e no coração, uma espécie de software para a negatividade total incorporado ao sistema mente-corpo, tornando a vida cada vez mais dolorosa.
Devido a sua relação de estreito parentesco com a dor crônica, a depressão tem sido comentada várias vezes nesse blog. E confesso que, com um pouco de constrangimento, porque a gente vai e volta no tema, sempre destacando suas mazelas e quase nunca apontando soluções. Cheira a beco sem saída.
Por isso, quando soube de uma experiência promissora sobre o assunto me apressei a comentá-la por aqui. Trata-se de um novo estudo, liderado por pesquisadores do Centro MRC para Genética Neuropsiquiátrica e Genômica da Universidade de Cardiff, que destaca o potencial do neurofeedback como um tratamento eficaz para a depressão.
A depressão, nem precisa dizer, é reconhecida como a maior contribuinte para a incapacidade em todo o mundo, e para um terço das pessoas afetadas por essa doença – porque ela é, sim, uma doença crônica – os tratamentos disponíveis, como antidepressivos e psicoterapia, são inúteis.
Mas segundo o professor David Linden, que supervisionou o estudo: “Existe uma clara necessidade de desenvolver novos tratamentos para a depressão, e nosso trabalho sugere que o neurofeedback de imagem por ressonância magnética (fMRI) tem o potencial de reduzir os sintomas depressivos em mais de 40%. ”
Leu direito? Nada menos que 40%! Isso é muito.
Mas vamos com calma. O que é neurofeedback? – antes de mais nada.
Uma técnica que treina a pessoaa a regular sua própria atividade cerebral. Ela, assim, permite que depressivos desenvolvam estratégias pessoais para autorregular áreas cerebrais e redes associadas às imagens mentais tóxicas que supostamente alimentam a sua depressão. E como se consegue isso? Através dos sinais de feedback que refletem os próprios padrões de ativação neural. (Se você tem dificuldade para entender o anterior clique aqui.) Quando os sinais de feedback são captados, processados em imagens via fMRI (functional Magnetic Ressonance) e realimentados para o indivíduo, para que ele espie o que acontece com a imagem no seu cérebro – como isso dispara certos pensamentos ou faz experimentar emoções particulares – o feedback é denominado feedback em tempo real.
E o que houve em Cardiff, afinal? Alí foi realizado um estudo controlado randomizado comparativo. Os pesquisadores contrastaram a regulação positiva de áreas cerebrais envolvidas no processamento de emoções (NFE) com um procedimento de controle ativo envolvendo a regulação positiva de áreas cerebrais envolvidas em processos visuais superiores (NFS). Note que o input do grupo NFE visa ativar emoções, e o do grupo NFS, apenas cognição. Assim sendo, o grupo NFE foi orientado a imaginar imagens positivas, enquanto o grupo NFS foi orientado a imaginar cenas relaxantes. Este desenho deu aos participantes de ambos os grupos oportunidade de autorregular uma experiência de sucesso e recompensa.
Os pesquisadores previram que o neurofeedback de áreas de emoção levaria o grupo NFE a obter uma melhoria clínica superior à observada no grupo de controle ativo (NFS). Porém, isso não ocorreu: ambos os grupos melhoraram significativamente: uma redução de 43% nos sintomas depressivos e uma taxa global de remissão de cerca de 38%.
Segundo o Professor Mehler, o fato de o grupo NFS também ter mostrado uma melhoria clínica substancial pode ser explicado por ambos os grupos terem passado por uma experiência semelhante, na forma (imaginética mental) e na recompensa (o efeito placebo de participar de um estudo científico).
Pode ser, porém, o mais importante é que ambos os grupos melhoraram significativamente da depressão. Comparando com outras terapias antidepressivas tradicionais os resultados foram pouco menos que espectaculares e assim o neurofeedback em tempo real (o qual requer necessariamente fMRI) promete ser, no futuro, um recurso eficaz (e mais ou menos acessível ao grande público) para tratar casos severos da doença.